Escrever era tudo que ele
queria. Não que tivesse, ou julgasse, ter alguma coisa a falar, mas pela
simples vontade de encher de letras a folha. Só queria executar o movimento. Sujar
o papel. Sentir a mão correndo sobre a folha branca, deixando um rastro preto
de nanquim, que a olhos treinados há de ter algum significado distinto, mas que
para ele, naquele momento, era unicamente o prazer de escrever. Ouvir o ruído áspero
da ponta da pena no papel. Experimentar sensação igual à que alguém, seu avô,
talvez, teve ao realizar a mesma operação. Teria o avô parado para pensar que,
dali a muitos anos, um neto estaria empunhando a mesma caneta, abastecido o
reservatório de tinta e saído a escrever? No entanto, o avô, quem sabe porque fosse
uma atividade natural, sequer pensou a respeito nas tantas vezes em que a utilizou.
Apenas a tinha para compor suas cartas, bilhetes, assinar trabalhos e cheques.
E nem foi pensando a esse respeito, também, que o avô presenteou a caneta à
filha quando ela terminou o colégio e entrou na faculdade (canetas eram
símbolos marcantes antes do advento das esferográficas). E a mãe a deu ao filho
não exatamente quando ele entrou na faculdade, mas quando saiu. Aí, quem sabe, já
existia uma intenção remota de juntar todo mundo. A mãe pensando no filho, que
usaria a mesma caneta do avô e, depois, seria o neto ou a neta. Colocou a tampa
na caneta e a deixou sobre o papel. Era hora de retomar a conversa com a esposa
a respeito de filhos e planos para o futuro.