sábado, 19 de novembro de 2011

Parker Vacumatic


Escrever era tudo que ele queria. Não que tivesse, ou julgasse, ter alguma coisa a falar, mas pela simples vontade de encher de letras a folha. Só queria executar o movimento. Sujar o papel. Sentir a mão correndo sobre a folha branca, deixando um rastro preto de nanquim, que a olhos treinados há de ter algum significado distinto, mas que para ele, naquele momento, era unicamente o prazer de escrever. Ouvir o ruído áspero da ponta da pena no papel. Experimentar sensação igual à que alguém, seu avô, talvez, teve ao realizar a mesma operação. Teria o avô parado para pensar que, dali a muitos anos, um neto estaria empunhando a mesma caneta, abastecido o reservatório de tinta e saído a escrever? No entanto, o avô, quem sabe porque fosse uma atividade natural, sequer pensou a respeito nas tantas vezes em que a utilizou. Apenas a tinha para compor suas cartas, bilhetes, assinar trabalhos e cheques. E nem foi pensando a esse respeito, também, que o avô presenteou a caneta à filha quando ela terminou o colégio e entrou na faculdade (canetas eram símbolos marcantes antes do advento das esferográficas). E a mãe a deu ao filho não exatamente quando ele entrou na faculdade, mas quando saiu. Aí, quem sabe, já existia uma intenção remota de juntar todo mundo. A mãe pensando no filho, que usaria a mesma caneta do avô e, depois, seria o neto ou a neta. Colocou a tampa na caneta e a deixou sobre o papel. Era hora de retomar a conversa com a esposa a respeito de filhos e planos para o futuro.

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